I
Terminadas as aulas do primeiro período, reunimo-nos na sala dos professores. Silas e Marta debatiam sobre os rumos da greve. Jhoana folheava alheia uma revista da Avon. Contursi comentava com Deodora e Maria Lucinda uma matéria sobre os benefícios da culinária mediterrânea. Isoladas em um canto, Debhora e Regiane falavam da quinta série. Meus olhos acompanhavam os movimentos labiais de Debhora. Emocionava-me apenas vê-la. Passei a ouvir suas argumentações em defesa de um certo Adamastor que Regiane cismava em pontuar com severas observações morais.
Quanto mais acompanhava Debhora, entrega-me a sua voz cariciosa discorrendo conceitos sócio-culturais a serem colocados em pauta na avaliação do comportamento infanto-juvenil, conceitos que tinham relevância nas práticas pedagógicas. Dava-me a consciência do fosso abismal que me separava daquele ser angelical.
Tal não foi, portanto, minha surpresa, quando, já por encerrar o intervalo, em breve sorriso, Debhora convidou-me a almoçar ao fim do segundo período. O coração disparou. Tartamudeei sem jeito assentindo ao convite, deixando ir, desastrosamente por terra, diários, estojo, giz.
II
Minhas pernas tremiam, as mãos suavam, a voz sumia. O pouco que conversamos foi para tratar de um ou outro assunto do cotidiano escolar. Temia olhá-la diretamente. Esperava por aquele momento de estar a sós com Debhora. Não sabia o que dizer, o que fazer. Sorria-lhe confuso.
– Damos uma volta pelo parque? Sugeriu enquanto acertávamos a conta.
III
Deixei-me conduzir por aquele ser extraordinário até uma área mais isolada. Sob uma frondosa mangueira nos firmamos. Sem rodeios, tirando os sapatos, ela estirou o corpo sobre a relva. Fiquei absorto contemplando seu rosto lindo, seu corpo formoso, seu sorriso despretensioso. Instintivamente, sentei-me a seu lado. Ousei tocar-lhe os cabelos. Ela acomodou-se em meu colo. Olhava-me e seus olhos negros turbavam-me.
– Tenho algo a dizer-lhe, disse ela, quebrando o encantamento em que me encontrava. Senti um calafrio percorrer-me a espinha. E sem me olhar, proferiu:
– Quero muito conhecer-te melhor, namorar contigo!
Era tudo que eu desejara ouvir, desde a primeira vez que nos vimos. Pomo-nos de pé. Segurando meu braço, puxou-me para ela. Nossos olhos entrecruzaram-se. Apertei-a fortemente. Aproximei meu rosto ao seu e sussurrei-lhe:
– É o que eu sempre quis.
Debhora enlaçou-me pelo pescoço beijando-me longamente.
IV
A primavera durou longos anos... Mas haveria de chegar o outono...
V
Amanhece. Atrasado, visto-me correndo, tomo às presas um copo de café, saio correndo para não perder o trem... Após oito horas de tedioso trabalho volto para casa. Preparo a janta. Tomo uma ou duas cervejas, os comprimidos... Ligo a TV e as fico mudando de canais... Assisto, alguns minutos, um programa qualquer. Ligo o notebook...
VI
Não sei se é sonho ou transe: Debhora toma-me pelas mãos e caminhamos entre crisântemos...
Nenhum comentário:
Postar um comentário