“O
aceso universal à Cultura não pode deixar de fazer parte das prioridades do
poder público”
A
pessoa humana é naturalmente cultural e a cultura é a sua forma de vida; o modo
pelo qual ela se situa no mundo, interage com o mundo e produz e significa o
mundo. Assim, a cultura exerce papel fundamental na vida humana. Sua tarefa
principal é construir um sentido para o
existir humano, um modelo de humanidade que seja adequado à dignidade e à
exigência da pessoa humana
Por
ser uma construção coletiva, ela se estabelece mediante a inter-relação Eu-tu,
no fazer e refazer o mundo. É mediante a inter-relação discurso-ação que o
humano interage com seus pares e vai dominando a realidade, criando e recriando
este mundo, acrescentando-lhe algo de seu, acrescentando-se a ele,
humanizando-o, humanizando-se. Nos Dizeres de Hannah Arendt (A condição
Humana): “É com palavras e atos que nos inserimos no mundo humano; e esta
inserção é como um segundo nascimento”. E no exercício deste novo nascimento, o
homem pensa, avalia, dá sentido, cria valores, escolhe e justifica suas opções,
organiza sua vida e de seu grupo: Forja a si um rosto. Tais procedimentos
constituem um complexo e rico mundo de símbolos, ideias e cosmovisões. Assim,
segundo Leslie A White, toda cultura depende do símbolo. É a “faculdade de
simbolização que cria a cultura e o uso de símbolos que torna possível sua
perpetuação. Sem o símbolo não haveria cultura, e o homem seria apenas animal,
não um ser humano” (in, Fernando H Cardoso, Homem e Sociedade). Para Lévi-Strauss
as relações humanas não são possíveis senão em função de um sistema simbólico,
pois “a vida social só pode emergir a partir do pensamento simbólico”. Através da cultura, então, o ser humano
destaca-se do mundo natural, cria um mundo próprio, determinando-se
culturalmente.
Enquanto
caráter identificador de uma determinada sociedade, a cultura se expressa nos
modos de viver e pensar desta determinada sociedade, e designa o patrimônio
social dos grupos humanos radicados historicamente nesta sociedade. A cultura
compreende, então, os conhecimentos, crenças, valores, ideologias, modos de
produzir e criar produtos e símbolos que caracterizam tal sociedade. De tal
modo, o universo cultural de uma comunidade humana particular é um sistema oniabrangente
que compreende a língua que se aprende, a maneira de se alimentar, o jeito de
sentar, andar, correr, brincar, o tom da voz nas conversas, as relações
familiares, a emoção, etc. Tudo isto existe no comportamento modelado em
sociedade e possibilita o estabelecimento das regras de conduta e dos valores
que nortearão a construção da vida social, econômica e política de tal
comunidade.
Assim,
cabe a cada sociedade projetar o modelo de pessoa que se plasma. O projeto
cultural de um povo, ou seja, as prioridades, os valores, o modelo de pessoa,
delineiam o caráter e a identidade da própria sociedade. O problema da cultura,
portanto, não é um problema apenas do Estado, é um problema de toda a
sociedade. É a sociedade que deve ditar-lhe os rumos. O Estado e sua
organização é uma construção humana, portanto, é também um bem cultural. Porém,
o Estado, enquanto expressão da sociedade, e a serviço da sociedade, não pode
eximir-se de suas atribuições. Cabe ao Estado, a serviço da sociedade,
incentivar a produção cultural, criando espaços para a criação, produção e
circulação de bens e serviços culturais; preservando e resgatando patrimônios e
documentos históricos; fomentando iniciativas artísticas, formativas, e de
pesquisa que evidenciem as características próprias de uma coletividade;
facilitando o acesso universal às produções e manifestações culturais,
incrementando e preservando manifestações culturais próprias de seu povo, etc.
Ao
defendermos, então, o direito universal à cultura, estamos reclamando ao Estado
o reconhecer a cada pessoa o direito a fazer parte da comunidade humana,
inserida numa história, numa sociedade, numa cultura própria, buscando
relacionar o sistema de representação simbólica de seu grupo às exigências de
um modelo social que ressalte e promova sua dignidade de pessoa humana.
Se reduzirmos,
pois, o papel do Ministério da Cultura às lei de incentivo, em especial à
Rouanet, ele não tem mesmo razão de ser. Num âmbito mais amplo, o debate
entorno da extinção ou não do MINC revela apenas a obtusidade do atual
desgoverno e dos que o aplaudem. Na
verdade, nutrir qualquer expectativa de uma IMPOSTURA, revela o quanto distante
estamos de uma CULTURA democrática e humanizadora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário