quarta-feira, setembro 14, 2016

ONDE NÃO HÁ FANTASIA FALTA VERGONHA

Por indicação de uma amiga, dediquei tempo ao texto do João Pereira Coutinho na Voz do Golpe (Folha de São Paulo), de ontem (13/09/2016). Poderia ter ficado no titulo: “Pior que a depressão é a vergonha que existe nos deprimidos”. A vergonha te barra, policia teu pronunciar, por recear um julgamento moral contra ti. Eu não tenho este sentimento de vergonha por ser deprimido, eu sinto que incomodo as pessoas. É sempre um incomodo às pessoas e não para mim saber que o meu ponto de equilíbrio com o mundo da racionalidade iluminista é devido a medicamentos e não por uma pulsão de mais vida. Basta você suspirar um breve lamento que o mundo a seu redor te sobrecarrega de florilégios do fantástico mundo do dr. Lair Ribeiro. Você se torna um estranho,  um estorvo ao mantra de autoafirmação de desejo de vida que procuramos recitar todas as manhãs. Se eu paro de tomar os medicamentos, sobrepõe-se-me o abatimento e o inclinar-se para corda. Então, por ora, os tomo. Meu desejo de mais vida é comprado na farmácia. Por que devo me envergonhar disto? Eu não provoco o meu mal-estar, ele é em mim como minha pele, meu cabelo, meus olhos... Não tenho porque me envergonhar por algo que não produzo. Então, para mim, pior que a depressão não é a vergonha, a não ser que fiquemos presos a arcaicos mitos, seja adâmicos, seja edípicos. A seu respeito há muita incompreensão clinica e muitas controvérsias neuropsiquiátricas. Numa sociedade vitalista, futurística, um sujeito abatido é um incomodo. Em mim não existe vergonha ou culpa por ser depressivo e inclinado a solucionar este mal-estar com cicuta, há a compreensão de que provoco insatisfações, contrariedades, mal-estar nas relações sociais. O depressivo, como a velhice, as deficiências, os cânceres, em um mundo voltado ao “hipergozo”,  é um incomodo não apenas no “adoecido”; é um incomodo maior nos que fantasiam a vida um todo harmônico, pungente, desejável. No depressivo não há vergonha, falta-lhe fantasia. O pior em qualquer doença é o seu valor social (se é coisa de gênios ou de fracassados). Eu não serei vencido pela culpa: já não sou filho nem de Adão, nem de Édipo; da doença não prometo: uma hora, talvez, eu pare com os medicamentos ou os “confunda” com a cicuta...  

Nenhum comentário:

Postar um comentário