... Ela
se jogou da janela do quinto andar
Nada é
fácil de entender... (Legião Urbana)
I
Você
acorda de manhã, faz a barba, toma banho, liga o rádio e acompanha o
noticiário. Os filhos se preparam para
ir à escola, a esposa ao trabalho. Depois de acompanhar o mais novo à escola,
você se dedica a cuidar do jardim, ler um livro, produzir uma crônica, um
artigo... preparar o almoço. Você faz planos de viagem, especula um presente
para a esposa, cogita levar os meninos na praça ao fim da tarde.
No
período da tarde você se dedica ao projeto de mestrado, confere anotações,
formula suposições, elabora opiniões, busca referências. Navega por seus
emails, por paginas de noticias, pelo Face. Os meninos brincam no quintal. Prepara-lhes o lanche. A ideia de os levar à praça se
prorroga. A mãe está para chegar. Você vai deixar para que ela prepare a janta.
Coloca os meninos para tomar banho, fazer o dever de casa, assistir televisão.
Toma um livro, folheia-o, aproxima-se da janela, contempla os girassóis
ensaiando o desabrochar. Um pássaro
pousa em seu jardim. Cisca aqui, ali; faz pequenos voos de uma galha da roseira
ao ipê, deste para uma haste de ferro, depois ao chão e, por fim alça um voo
infinito.
O vento, ou algo que vem de dentro,
sussurra-lhe versos de Leopardi: “Non gli uomini solamente, ma il genere umano
fu, e sarà sempre, infelice di necessità. Non il genere umano solamente, ma
tutti gli animali. Non gli animali soltanto ma tutti gli altri esseri a loro
modo. Non gli individui, ma le specie, i generi, i regni, i globi, i sistemi, i
mondi... è in stato di souffrance, qual
individuo più, qual meno”
O
colorido do dia esvanece, o abismo se abre...
II
Não
é desemprego, não é conflito amoroso, não é ambiente estressante de trabalho,
não é medo ou covardia diante de um mundo conturbado, angustiante, não é a
falta de expectativa, de empatia, de desejo de vida... Tudo é meio, não motivo.
Um salto do décimo quinto andar é in-causado. É sintoma, não sofrimento.
III
Desceu
ao jardim, limpou-o. Ajustou uma cova rasa. Semeou-lhe sementes. As cobriu de
terra, que logo regou. Acocorou-se. "O que fazes?” perguntou-lhe voz de
dentro, concluindo: “é noite ainda!”. "Vigio a flor que ei de
contemplar!", respondeu. Tinha desejos de cicuta.
IV
O
desejo de morte é uma conturbada esperança!
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