É
mais que o encontro tátil da vista com o objeto. É uma experiência existencial e pessoal em que nunca estou certo de que vi o que vejo: O
mundo não é claro, meus sentidos não são confiáveis, minhas emoções fundam-se
em experiências passadas e em expectativas futuras. Em algum ponto o sentido
profundo das coisas me escapa. Leio o mundo ciente de minha miopia.
Como
o óculos que corrige meu olhar, como o telescópio que potencializa e amplia
minha visão, como o microscópio que me evidencia particularidades do objeto, a
palavra corrige meu sentido de mundo, aproxima-me e distancia-me dele e me
permite retornar sobre ele. Com o domínio da palavra, amplio minha visão de
mundo, e o que vejo-leio é mina posição (ou o absurdo de crer em uma minha
posição) no espaço-tempo mundo.
Ler,
então, não é somente juntar letras e formar palavras, criar sentidos. É
sobretudo sair de minha segurança, de minha certeza, da garantia que tudo faz
sentido e tem sentido.
“As
palavras enganam”, dizia minha tia. E Marguerite Yuorcenar lembrava-me sempre
que os livros apresentam “erros peculiares de perspectiva entre suas
linhas..."
A
leitura marca ao mesmo tempo a morte de uma compreensão de mundo e a sua
metamorfose. A realidade muda, transmuda, ante nossa leitura, Nós a vemos
alargada, ampliada ou pontuada em seus detalhes diminutos. A leitura é uma ação
originadora de novos sentidos que nos impelem a entender que o ver o mundo não
é vê-lo em sua totalidade.
Termino
com Adélia Prado:
Antes do nome
Não
me importa a palavra, esta corriqueira.
Quero
é o esplêndido caos de onde emerge a sintaxe, os sítios escuros onde nasce o
"de", o "aliás", o "o", o "porém" e o
"que", esta incompreensível muleta que me apoia.
Quem
entender a linguagem entende Deus cujo Filho é Verbo. Morre quem entender.
A palavra é disfarce de uma coisa mais grave,
surda-muda, foi inventada para ser calada.
Em
momentos de graça, infrequentíssimos, se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a
mão.
Puro
susto e terror.
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