Meu compadre Marco Maida, em conversa com o escritor Ademiro Alves de Sousa (Sacolinha), contou-nos uma sua experiência num seminário premonstratense. Ele fora a este seminário para um retiro, e, diz o compadre, ao ir banheiro, sentiu-se incomodado com a figura do olho de Deus gravado na porta do banheiro. Junto à figura se lia: “Deus omnia videt”, Deus tudo vê. O incomodo do compadre foi tanto, que ele se resolveu entre moitas. Lembrei-me de que minha avó, quando fazíamos arte e tentávamos evitar a reprimenda, inventando histórias, nos alertava: “Ói menino, cê num mente pr’eu não, cê num mente não, que Deus tá vendo, Deus castiga!”. Não à toa meu compadre sentiu-se incomodado com os olhares de Deus no banheiro. Tal serve para ilustrar-nos que, não obstante professarmos que Deus é amor, e que ele está sempre disposto a perdoar (77 x7 vezes, como ensinou o Cristo), nós herdamos uma concepção assustadora de Deus. O Deus do Cristo, que acolhe, que perdoa, que cura, que doa-se, que, em resumo, ama incondicionadamente, tornou-se um Deus impiedoso, ávido por nos impor castigos. Assim, o Deus que tudo vê é um Deus sempre a espreita para pegar-nos em erro. Na verdade, este Deus, embora tudo possa ver, só tem olhos para o pecado e é um Deus que goza de nossos receios, de nossos temores. O Deus que tudo vê, como o herdamos, é um Deus sádico. Mas “se pudéssemos surpreender Deus em seu voyerismo, observaríamos sua face ruborizada de criança curiosa, pega à fresta da porta.” Quem disse-me isto foi um monge camaldolense. “Deus não nos observa no afã de nos castigar. Deus contempla a criação e certifica que tudo é bom. Na narrativa da criação, o autor de Gênesis afirma cinco ou seis vezes que Deus vê o que faz e certifica que é bom. E que ao homem e a mulher, Ele abençoa. É este o nosso Deus, nosso Deus é um Deus que tem olhos para o que é bom, não é um Deus que castiga; é um Deus que abençoa.” À clássica figura do triângulo com um olho ao centro, o monge me apresentou um olho infantil incrustado numa fresta. “O olhar de Deus é o olhar de uma criança curiosa do outro e que se encanta com o que há de mistério e beleza no outro. Deus não está atrás de nossos pecados. Ele está sempre atrás de motivos para nos continuar abençoando. Nosso Deus, não é o Deus do castigo, é o Deus da benção!” O Sacolinha perguntou a meu compadre se ele era ateu. Meu compadre guardou silêncio. Deus ri-se. O silêncio de meu compadre é muito bom!
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