Olá!
Como vocês estão? Espero que bem e se cuidando, seguindo as orientações
sanitárias, usando máscara, álcool em gel, saindo apenas se necessário,
mantendo distanciamento social, evitando aglomerações.
Não
sei se vocês têm ou não uma crença, se vocês são ou não cristãos. Não sei, se
vocês sendo cristãos, seguem ou não algum movimento ou Igreja. Independente
disto tudo, crendo ou não, seguindo ou não esta ou aquela igreja, somos
culturalmente cristãos. Até mesmo para negar a existência de Deus, negamos da
perspectiva cristã.
Quero
tratar aqui com vocês, respeitando a sensibilidade religiosa de cada um de
vocês do evento da paixão de Jesus, o Nazareno, que culmina em sua morte na cruz.
Lembro que há dois eventos da história do crucificado que requerem a dimensão
da fé: sua concepção virginal; sua ressurreição. Mas a vida que Jesus viveu, as
opções que orientaram sua ação existencial e que o levaram à prisão, à tortura,
a um julgamento forjado, a uma condenação espúria, a uma morte ultrajante, dá
se do arco das ações humanas, não há nesses eventos intervenção divina. Na cruz
não ocorre um deicídio, há o assassinato de um homem, de um ser humano. O homem
transfigurado na cruz revela a crueza a que nós homens, quando nos apegamos ao
poder, à riqueza, à falsa honra, podemos chegar. “Jesus morreu por nossos
pecados.” Este “por” não significa, de modo algum, em nosso favor. Morrendo na
cruz, Jesus não nos alivia de nossos pecados. Não, este “por”, é imputativo. A
morte vergonhosa de Jesus é responsabilidade nossa, Jesus morre por nossos
atos, por nosso apego ao poder, à riqueza, à falsa honra.
A
sua vida e o seu ensinamento foram um confronto continuo contra as autoridades
religiosas, políticas e econômicas, que usam do saber e do prestígio para
enganar, expropriar, explorar, perseguir, matar. Jesus evidencia que todo poder, toda riqueza,
todo mérito sustenta-se da dor, do sofrimento. Para Jesus não sentido uma
pessoa, em nome de Deus, acumular terras que não produz, casas cheias de
quartos que não habita, bens que não usufrui e as traças corroem, ante
multidões famintas, doentes, desempregadas. Para Jesus não há preguiça, não há
acomodação, não há desinteresse nos desfavorecidos, há exploração e
expropriação. A pobreza é roubo. E usa-se o nome de Deus para justificar tal
roubo.
“Jesus
morre para cumprir a vontade de Deus”, do seu Deus. Mas não é vontade de seu
Deus que ele morra. Ele morre, porque ao cumprir a vontade de seu Deus, ele vai
contra nossa mesquinhez humana. Nós matamos Jesus porque a vontade de seu Deus:
um mundo fraterno, um mundo em que as coisas sejam comuns, o pão chegue a todos,
a terra seja de todos, em que as pessoas sejam respeitadas, acolhidas, tenham
vida digna, assumam suas escolhas, não nos interessa.
Jesus
para cumprir a vontade de seu Deus não pode abrir mão dos perseguidos, dos
doentes, dos expropriados, dos explorados, dos encarcerados, que por perceberem
as tramas religiosas, políticas, econômicas, se opõem e se insurgem contra elas.
Não, Jesus cumpre até o fim a vontade de seu Deus, consequentemente é
assassinado. O Deus dos templos, o Deus dos sacerdotes, o Deus dos cidadãos de
bem, o Deus dos caridosos que dão esmolas com a moeda da viúva e do órfão, não
é o Deus de Jesus. A morte de Jesus não é vontade de Deus, não do seu Deus, a
morte de Jesus é fruto de nossas ações, é em nome de nossos interesses, é em
nome do Deus do privilégio, do mérito. “Jesus morre por nossos pecados”, somos responsáveis
por sua morte.
O
cristianismo que se desenvolveu após a morte de Cristo é um retorno ao Deus dos
templos, dos sacerdotes, dos senhores, dos cidadãos de bem, dos meritocratas,
dos que fazem caridade com o que tiram dos pobres. No corpo pendendo na cruz
vislumbramos o fracasso do Deus de Jesus. O Deus de Jesus, com o cristianismo perdeu
espaço, em seu lugar assumiu o Deus doador de privilégios para alguns, “os agraciados”,
e o deus terrível, o Deus Castigo dos empobrecidos, dos expropriados dos
perseguidos.
O Cristo
transfigurado na cruz ilustra do que somos capazes, por nossos pecados, para
não abrir mãos deles, de fazer com um ser humano. Não é preciso ter fé, não é
preciso crer em Deus, para ver no Cristo morto nossa capacidade de transfigurar
a humanidade. Nós temos o poder de desumanizar o ser humano e usar Deus como
escusa. A missão de Jesus é um fracasso.
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