Certa
feita, conversávamos eu, Eurípedes dos Santos e Rodner Lúcio. Era conversa, a meu
juízo “de homem”, pois falávamos de futebol, política, mulheres. Já ai, Rodner
me advertiu: “não há conversa que seja de homem e conversa que seja de mulher!”
Mas aquela era, bem dizer, uma novidade em nossos encontros, porque Eurípides e
Rodner eram, geralmente, monotemáticos. Um falava apenas de educação, o outro
de literatura. Mas naquela ocasião única falávamos de assuntos variados e
distantes de nossos campos de ação. Faltava à mesa, e talvez por isso a “conversa
de homem”, Christine Ramos, moderadora dos embates entre Eurípedes e Rodner. Eu
pensei que podia dar o meu parecer a respeito da matéria em curso, e soltei: “ela
é bonita e inteligente!” “A você, meu caro, disse Eurípides, além destes
atributos, carece compreensão do ser feminino.” Ante minha expressão de
incompreensão, ele explicou: “o “e” em tua fala é ofensivo à dignidade da
mulher, dá a entender que uma coisa exclui outra. Não é a condição estética da
mulher que a torna inteligente. A mulher é inteligente por ser mulher. É do ser
da mulher ser inteligente.” A conversa continuou acerca da tabela da Copa que
se aproximava e das possibilidades do tetra, que viríamos conquistar. Pelas
tantas soltei: “Ô, lá em casa!”, para a menina que servia uma mesa ao lado. Novamente
Eurípedes me arguiu: “Meu irmão, o princípio que tens para Christine, mesmo
alcoolizado, tenhas para com todas as mulheres. Queres ser cafajeste, não o
sejas em minha presença!” Rodner também manifestou-se: “Veja, a Christine não
está aqui, então nos permitimos falar de mulheres, mas falamos como se ela
estivesse aqui. O que não nos permitimos falar ante Christine, não nos
permitimos falar em sua ausência, não só dela, mas de qualquer mulher. Nosso
respeito não é pela Christine, é pelas mulheres. O não usar determinados
termos, ou expressões, ante Christine é uma atitude moral, é de nossa educação.
Não usá-los na ausência de Christine é ético, porque se estende a todas as
mulheres. Algo que possa ofender Christine, ofende todas as mulheres. Não
ofendemos Christine por ela ser nossa amiga, não a ofendemos por ela ser mulher.
O respeito que temos com Christine é o respeito que temos por todas as
mulheres. Este princípio vale no trato com qualquer pessoa, homem ou mulher: se
algo me ofende, ofende a todos.” Mesmo alcoolizados, as conversas de Eurípedes
e Rodner sempre acabam em lições. Não, não sei porque ando com eles, eles não
são deste mundo.
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