Minha
professora de história repetia ao fim de cada aula: "leiam o jornal, saber
o que acontece hoje é também história". E eu lia. Lia a coluna policial e
a coluna social. Vez ou outra lia a coluna de esportes. Colocadas lado a lado,
coluna policial e coluna social ilustravam a Belíndia, termo criado pelo
economista Edmar Bacha para apontar o fosso que separa o diminuto grupo de pessoas
cujo padrão de vida é elevado da massa de pessoas que vivem em extrema pobreza.
Na coluna policial se escorria o sangue
da massa preta e pobre, na coluna social se exalava o aroma e o perfume das
madamas e homens de negócio, que uma colunista batizou: “Massa cheirosa”. “O
perfume – dizia um amigo – é um dissimulante. Sobre nosso cheiro natural
impostamos as fragrâncias de rosas, jasmins..., mas no fundo cheiramos mal”. O
cheiro natural dessa “massa cheirosa” que ilustra as colunas sociais é a do
sangue que se derrama nas colunas policiais. Sob o agradável cheiro das madamas
e dos cavalheiros encerra o odor do sofrimento, da exploração, da expropriação
de vidas expostas à miséria. E os
jornalões nunca dissimularam de que lado da história estão, e não pode ser
diverso. São os cheirosos que os mantém. A massa preta e pobre não os lê, os
usa para atiçar o fogo da lenha, parra forrar o chão e cobrir-se em noites
frias. Então, não há novidade se não mancheteiam ou noticiam as manifestações
contra nosso genocídio. Aos jornalões interessa apenas nosso sangue
escorrendo em suas páginas policiais. A nossa luta, a nossa resistência, a
nossa mobilização tira a tranquilidade do domingo dos cheirosos, então é melhor
não da-la. Mas não importa, que os jornalões nos desconsidere, nunca contamos
com eles. Ignorar que existimos, não nos faz deixar de existir nem de resistir.
No passado, contra os jornalões e seus senhores, tínhamos os mimeógrafos, hoje
temos as redes sociais. Se o cheiro natural das massas cheirosas é o de nosso
sangue em suas mãos, o nosso cheiro natural é o de nossa luta, organizando-a,
ele há de se espalhar. E nosso cheiro não será manchete, será história que nós
mesmos haveremos de contar. Contra o silêncio dos covardes, não nos acovardemos:
FORA GENOCIDAS!!!