Eu nasci rio, para fluir e avolumar. Carrego esta irresistível tendência de correr às fontes. (Rodner Lucio)
Eu nasci árido, seco: Uma flor insiste fragilmente fincar-me raízes. (Euripedes dos Santos)
Nascemos para aquela que foge-nos quando a anelamos e captura-nos quando menos a esperamos. (Zózimo de Ítaca)
Eu não nasci, fui lançado ao mundo. E logo assumi pouco apreço pela vida. Às coisas do mundo pouco me apego. Pra não-ser é que fui lançado na existência. Do mesmo modo que nasci, morresse agora, seria como fio de cabelo em vasta cabeleira, o mundo não daria conta. Talvez esta seja a falta com que nasci, o meu desejo é não desejar. Tenho anseio de suspensão, de quietação, de não envolvimento com o mundo e seu continuo desassossego. Sei apenas, compulsivamente, ler e escrever. A compulsão não esclarece: tortura. Não aplaca: tormenta. Circula na internet um dizer de Darcy Ribeiro: “Fracassei em tudo o que tentei na vida”. Eu também vou fracassando. Caído no mundo, cai, como Macunaíma, com muita preguiça. Estando e ansiando não estar é preciso ir existindo e assumindo caminho. É contra sua vontade que a água escorre ao mar, pudesse voltaria sempre à fonte. É contra minha vontade que escolhi muito cedo o lado dos que fracassam, a diferença é que eles alentam coisas que eu não alento, que “o oprimido pode expurgar de si o opressor, libertando a si e ao opressor, humanizando-o” (Paulo Freire). Esta é uma luta perdida. Nasci para assumir lutas perdidas. Nasci para o fracasso. Hoje é um bom dia para deixar de ser, para me abandonar do mundo, ele não sentiria falta, seria cisco afastado pelo vento a lugar nenhum. Mas os desumanos se erguem à luz do dia com suas palavras de preconceito e ódio. Ao meu redor o que vejo são canalhas e cretinos pregando excrescências: militarismo, tortura, pena de morte, armamentismo... Assomo-me aos que ousam exigir direitos, educação, trabalho digno, boa remuneração, moradia, terra..., essas lutas que se perdem dia-a-dia. Não alento sonhos, o mundo se destina à ruína. Mas existindo temos que assumir lados. E os que eu abraço e com os quais sou solidário clamam: “Vamos à luta!” Então, a desejada noiva há de esperar, se não vem e me captura. E nessa batalha que se perde sempre, faço a única coisa que sei: escrevo. E minha escrita é orvalho em terra árida, bem sei. “Cada batalha perdida torna-nos cinzas, e das cinzas renascemos”, de uma frágil flor que insiste em fincar raízes em mim. Por ela existo, insisto, resisto, minha amada, se não me captura, há de esperar: vou à luta.
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