sábado, junho 26, 2021

DORMINDO COM O JAIR

 

Jair era avesso à boa higiene e não era novidade. No departamento, todos sabiam e comentavam.  E Jair não fazia questão nenhuma de esconder isso. Havia pronunciamentos dele a respeito dos hábitos de higiene, principalmente banho: “Quem gosta de tomar banho é índio, que não sabe fazer outra coisa”, “quem tem que tomar banho é preto catinguento”, “é mulher de vida fácil, que toma banho frequente”, “banho é coisa de fresco” Mesmo assim, tinha quem acreditasse que Jair pudesse-ser o superintendente do departamento de higiene, e foi levado ao cargo: “Ele só cheira mau! É orgânico”, “Ele tem mau hálito, mas é do estomago”, diziam. “Fará uma limpeza no órgão”, prometiam. Devemos lembrar, que Jair passara uma vida no setor de regulamentação e normas, sem apresentar uma única proposição. Com Jair o departamento de higiene tornou-se inadministrável.  O gerente de fiscalização do comércio anulava multas, desautorizava fiscais, posava ao lado de comerciantes multados. O gerente da qualidade dos alimentos propunha relevar a validade dos mesmos. Para o gerente de zoonose, só animais com pedigree mereciam cura. “Pedigrees, são de família, da família de bem. Aos vira-latas: o sacrifício!”, anunciava, sem pudor! Entre os atos do Jair e as iniciativas da vigilância sanitária o conflito era, dia-a-dia, mais patente. Jair contestava todas as ações do órgão e, de suas orientações, fazia tudo ao contraio. Em um evento para crianças, tirou caca do nariz, coçou a bunda, fez entender que não lavava as mãos ao usar o mictório e escrevia excrescências em portas de banheiro com a própria fezes.  E, pasmem, senhores, sob salva de palmas. Um pai chegou a dizer, entusiasmado: “O Jair é um mito de espontaneidade!” Não obstante a popularidade, começaram os buxixos, os descontentamentos, os questionamentos: “quem consegue dormir com o Jair?” “O Negão consegue!” “Aquela menina de cabelos vermelhos, a Espanhola, não sai do saco dele”. “E o Fabinho, da comunicação?” “O corregedor, também! Até disse que denuncias contra ele não têm peso.” E Jair vai por ai, espalhando seu mau cheiro, seu mau hálito, seu caráter mal, e por onde passa tem quem o aplauda.  “O problema, fii”, dizia vó, “não é dormir no chiqueiro: é passar a dormir com o porco.” “Quem dorme no chique”, explicava tia, “ainda sonha com um bom leito. Mas quem dorme com o porco é como ele, habituado com a lavagem.” A meu ver, os que dormem com o Jair são menos higiênicos que ele.

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