Para Ione Viana de Souza
“Muitos negam a existência do amor, mas todos desejam ser amados” (Christine Ramos)
Tudo o que pensamos, tudo o que realizamos tem um só propósito: o nosso bem. E este bem, Aristóteles definiu como Felicidade. E segundo ele, a felicidade é o mais importante, ou, até mesmo, o único fim das ações e desejos humanos. E para Aristóteles o amor (philia) está no centro da vida feliz. Philia descreve o sentimento recíproco de bem querer sincero e benéfico entre os amantes (amigos). Sem quem nos ame, e sem quem amar, a felicidade perde o sentido.
Em sua Retórica, diz Aristóteles: “amar é querer para alguém aquilo que pensamos ser uma coisa boa, por causa desse alguém e não por causa de nós.” (Aristóteles. Retórica. Tradução e notas Manuel Alexandre Júnior, Paulo Farmhouse Alberto e Abel do Nascimento Pena. Lisboa: Centro de Estudos Clássicos da Universidade de Lisboa. 2005: p. 170)
Na Ética a Nicômaco, Aristóteles descreve três formas de Amizade: a) por prazer, em os amigos se buscam porque há um prazer recíproco no convívio entre eles; b) por necessidade, em que os amigos se associam um ao outro porque são úteis entre si e retiram da amizade algo de interesse próprio; c) pela amizade em si mesma, em os amigos se procuram porque querem bem uns aos outros. Aqui, busca-se o bem do amigo por amor ao amigo.
Este tipo de amizade requer, na compreensão aristotélica, benevolência: o desejo do bem ao outro, desejo que se atualiza no fazer bem ao outro. Mesmo que este desejar e procurar o bem ao outro seja desinteressado, na concepção de Aristóteles, a amizade exige reciprocidade. Também o que recebe o bem o retribui. É esta relação de troca de bens pelo bem do outro, pelo outro, que caracteriza o amor.
Subjetivamente nós procuramos para o nosso bem o que é melhor: o belo, o bom, o perfeito. No amor identificamos o bom com gentileza, educação, cordialidade, respeito, carinho... Assim, na expectativa de sermos amados, esperamos encontrar alguém gentil, carinhoso, compreensivo, sensível, cortez, inteligente, dedicado, acolhedor, educado... que nos ame como somos: com nossos erros, nossos vícios, nossas manias, nosso complexo de Gabriela: “Eu nasci assim, eu cresci assim. Eu sou mesmo assim. Vou ser sempre assim. Gabriela, sempre gabriela” (Dorival Caymmi: Modinha para Gabriela).
Nós, no entanto, não nascemos com nossa subjetividade. Ela se forma de nossas experiências e de nossas relações com as pessoas e a cultura que nos envolvem. Nossa subjetividade caracteriza ao mesmo tempo nossa singularidade, somos únicos, que não significar ser sempre o mesmo, e nossa sociabilidade: não sou sem o outro. Quando sei ser querido, amado, amo-me. Eu me quero bem se há quem me queira bem.
Neste sentido, dizer eu-te-amo desdobra-se em dizer eu- me- sinto-amado. E aqui eu discordo de Freud, para quem o amor a si mesmo excluiria o amor ao próximo. É preciso que saibamos nos amar, a querer-nos o melhor, como diria Sócrates, para podermos amar alguém. Só deveria dizer eu te amo, quem sabe se amar. No entanto, só podemos saber o que é nos amar se nos soubermos amados, e sempre somos amados por um outro. Nós nos amamos como somos amados por um outro. Numa perspectiva sartreana, se nós somos aquilo que nos fazemos daquilo que nos fazem: Eu me amo do amor que me amastes! Dizer eu te amo é dizer: Em ti me percebi amante por ser amado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário