quarta-feira, junho 12, 2019

O CASO CARLUXO



Embora pavio curto e grosseiro, Flavio Eduardo Carluzzo não era de ir às vias de fato. Elevava a voz, gesticulava apontando o dedo, cerrando o punho, dizia impropérios, parco de argumentos era como se impunha. Quando presente, as pessoas, então, evitavam assuntos polêmicos, sobretudo, questões de gênero. Carluxo, como os amigos o chamavam, tinha posições extremadas: “queimaria todos esses comunistas de merda na fogueira!” Aconteceu que a companheira de Carluxo, dado dia, desapareceu. Investigado, Carluxo foi indiciado e formalmente acusado da morte da companheira. A procuradoria, na peça acusatória, mesmo alegando não ter encontrado o corpo da vítima, afirmava que ela havia sido executada a golpes de faca. E fundamentou sua convicção no perfil grosseiro e agressivo do réu, e na ausência de uma faca num jogo de facas suíças que o réu ostentava em sua cozinha. Para a promotoria, a faca faltante teria sido ocultada junto com ao corpo da companheira desaparecida. À falta de provas, o promotor arengou que a prova “do maior crime, jamais cometido na história da humanidade”, era justamente o fato não ter prova alguma, “a prova cabal das convicções da promotoria”. Assim, “não haver provas confirmam nossa tese de que o réu é o maior criminoso de todos os tempos!”, concluiu o promotor contra Carluxo. Para convencer o júri de suas teses, a promotoria até montou um elaborado PowerPoint, apresentando situações conflituosas em que o réu se envolvera desde a mais tenra idade. Mas o apelo maior da promotoria foi à comoção que o caso havia suscitado na comunidade. Durante meses, a mídia havia alimentado tal comoção. Diuturnamente se reprisava imagens de Carluxo e seus gestos grosseiros, seus posicionamentos extremados, sua parca razoabilidade; narrava a simpatia, a generosidade, a ingenuidade da companheira. “A comunidade exigia o sentenciamento de Carluxo”, apelava o promotor, reforçado por comentadores de noticiário (jornalismo é algo que falta em Bananópolis). Para a comemoração de muitos, Flavio Eduardo Carluzzo, foi sentenciado após seis meses do desaparecimento da companheira. A celeridade do processo foi louvada e atribuída, em laudadas tintas de jornais, à competência e firmeza de caráter do juiz do processo. O fato é que recentemente a desaparecida companheira de Carluxo apareceu. Conta-se que, enfastiada com nossos ares, a nobre dama andava pela Europa, fazendo compras; aproveitou para levar a faca para um ajuste numa oficina especialidade na Suíça. Mas, pasmem! Caros leitores, nossa desaparecida foi vista, nada mais, nada menos, que sendo cortejada pelo eficiente e impoluto juiz que presidiu o júri de seu suposto assassinato. Questionado, o honrado guardião da lei afirmou não vê motivo para suspeição ou constrangimento, “visto que só nos conhecemos após a conclusão do referido processo.” Há comentários, porém, de que o cúpido dessa relação não seria outro que o promotor do caso Carluxo. A comunidade está chocada, mas há quem escuse o relacionamento de nossos pombinhos. “Carluxo, pelo perfil que tem”, dizem “tem que estar preso.” Bananópolis tem este tipo de gente, geralmente se dizem cidadãos de bem e torcem para que o Varão de Bananópolis, como é conhecido nosso juiz, assuma nossa desaparecida.

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