I
Eu
tenho posições muito pouco claras e muito pouco serenas sobre o suicídio. Há, a
meu ver, suicídios que são resultados de doenças psíquicas reunidas e resumidas
na depressão. Há as pressões sociais, políticas, econômicas que influenciam a
prática. Ao fim, é só uma forma de morrer. E como uma forma de morrer, é a que povoa
meus pensamentos. As circunstâncias políticas e econômicas são propícias, as
estruturas psíquicas também favorecem... No entanto, há, ainda, em mim, a vaga
consciência de que nenhuma escolha pessoal produz efeitos apenas sobre quem
escolhe: toda escolha pessoal atinge a comunidade afetiva de que um faz parte.
E minha comunidade afetiva não está preparada para um gesto individual
impactante como o suicídio. É esse frágil elo, essa, às vezes, quase apagada
consideração de afeto e de responsabilidade aos afetos da comunidade afetiva
que me vai firmando. Mas, há dias que o desejo é de renuncia... Há também o
receio do fracasso, algo possível em qualquer empreendimento humano. Este é o
fio mais resistente.
II
Quando
adoecemos, adoecemos também as pessoas a nosso redor, as tornamos reféns de
nosso adoecer. As doenças psíquicas, principalmente, aprisionam as pessoas a
nós. Um doente é um incomodo... Não devíamos ser gaiolas para ninguém. Não temos
o direito de tolher a existência, o desejo de voar das pessoas que nos cercam. Para
elas deveríamos ser trampolins, ser apoio, sustento para que desenvolvam suas
potencialidades. Ao adoecer deveríamos nos
afastar, e eu tenho estado com esta ideia na cabeça... Se você some, você cria
um desespero nas pessoas, morrer as liberta.
III
A
morte é uma transcendência da condição humana. Qualquer que seja a maneira, não
se dá quando queremos, como queremos. Mesmo no suicídio morrer não é um ato de
vontade; é um acontecer. A morte, seja de que modo for, é um acontecer. O acontecer
é um kairós, um tempo oportuno, um tempo de graça. Morrer é doação no tempo. A
morte tem o seu momento; o ato de vontade as circunstâncias, o gatilho que o
dispara... Às vezes, o ato de vontade e o acontecer se encontram, mas nem
sempre. A incerteza nos faz hesitar... Eu projeto-me me passar, o acontecer
espreita, mas não se aproxima, aguarda as circunstâncias... Eu a certeza de
sucesso...
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