Nossa razão é um Davi frente ao que nos desarrazoa! (Eurípedes dos Santos)
Era um
setembro. Saí nauseado da empresa. Remoendo insignificâncias, arrastava os
passos para a estação, não via por que chegar em casa. Arrastava-me para a
estação conjecturando um salto. Uma fraca razoabilidade lutava em mim: “Pedir
demissão, era o mais sensato a ser feito.” A desrazão sussurrava recalcadas
insidias. Era um setembro, arrastava-me
por um beco escuro, cheirando a urina e
fezes. Um casal copulando, trouxe-me à mente “Bicho”, do Bandeira. Que
readequei ao momento: “Vi ontem um casal de bicho/ Na imundície de um beco/
copulando entre os detritos...” Veio-me de vomitar. “O mundo é este deprimente
absurdo!”, sorria-me o desejo de não ser. Alcancei a Almirante Afonso, a
estação fica à esquerda, tomei à direita. Deixava-me me conduzir por meu pouco
apetite de vida. Fui dar na passarela da Algustina Freire. Amparado ao
parapeito da passarela, contemplava a fila de carros lá embaixo em ritmo lento.
Conjecturava o melhor momento. De algum canto uma canção invadiu-me:
“Eu quero gozar no seu céu, pode ser no seu inferno...”. Veio-me o dia
que teus olhos brilharam ao meu olhar e teus lábios sorriram-me, e, em teu gozo
encontrei-me, por algum instante. Naquela noite, era uma outra a canção do
Belchior que tocava na jukebox, num bar da Aguiar Coutinho: “Eu estou muito
cansado do peso da minha cabeça...” No fim da noite, foi meu corpo a ficar todo
marcado de batom, num pulgueiro da Alameda Comendador Eurípides. Mergulhava-me
nestas lembranças, fios tênues me mantendo. Olhares ressabiados passavam por
mim. E neles eu via a luz do teu olhar, o sabor de teus lábios. À lembrança de
teu riso, do teu gemido estremecido, estremecendo-me, do teu cheiro depois do
gozo, recobrei a promessa que a ti fiz: “só por hoje não morro!”. Corri a
perder o fôlego, para chegar o quanto antes a teus braços e aninhar-me em teus
sonhos... “Só por hoje insisto de ser-te motivo de existir. Não te demores: te
amo perdendo-te em mim!”, leio num bilhete, marcado de batom, à porta da
geladeira. Tomo meu café e saio para vencer o “leão do dia”, com aquele
setembro espreitando-me. Saio com a promessa que te fiz: “só por hoje, eu não
morro!”
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