Foi tia quem contou, em redor da fogueira, depois de as mulheres rezarem terço.
- Foi
num outro tempo, quando ainda não tinha a ponte e se dava a atravessar de
piroga para ir assistir missa na matriz. Padre, era de quando e quando que
vinha de lá pra cá. Em quando de colheita. Então, se preparava batismo, se
ajustava casamento, e se fazia missão. Neste tempo, tinha cá padre Domingos. Era
– crianças tapem os ouvidos – pecado de homem.
Pe Alípio,
que rodeava fogueira com nós, abriu um sorriso cumplice.
-
Neste tempo de ontem, tinha cá Maria Rita de formosura sem par. Num morava na
vila, não. Morava ali, pra riba da pedra do riacho. Ali, onde hoje se ergue o condomínio,
que secou o riacho e devastou a mata. Ali as mulheres lavavam os panos, os
meninos as meninas abandonavam-se brincando nas águas. Maria Rita morava ali, num
casebre no meio da mata. Era de Maria Rita vir banha-se no riachinho e
estender-se na pedra, bem antes de o sol nascer. Era pra evitar olhares de
homens indecente. Padre Domingos organizou naquele tempo missão que chamou de Tríduo
de Nossa Senhora da Redenção. E veio com ele comitiva de seminaristas e
noviços. Armaram tenda ali onde hoje é a igrejinha de São Domingos de Cocullo.
Ficaram, por aqui uns quinze dias, assistindo os doentes, ensinando os
Evangelhos, ajudando na colheita. Nestes dias Maria Rita não se fez ver, era
como se tivesse viajado. No dia em que a missão terminava, Pe Domingos levantou
antes do sol. Deu hora das rezas dos seminaristas com Pe Domingos...
- É as laudes, explicou Pe Alípio...
- Bem
era as laudes, e Pe Domingos não se achava. Um dos seminaristas foi acudir de
procurar Pe Domingos, e no acampamento e a seu redor não se achava Pe Domingos.
E procurando daqui, procurando dali, os seminaristas e noviços se deram com Pe
Domingos petrificado la onde era a pedra do riachinho, enrolado a ele uma
serpente se escapou mata a dentro, quando os homens vieram acudir os apelos dos
seminaristas. Dai que as mulheres
passaram a cantar quando iam ao riachinho lavar os panos, e mesmo já não mais
lavando os panos no riachinho, observem, as mulheres ainda hoje cantam nos
afazeres domésticos.
Pe
Alípio achava graça da história que tia contava para explicar a imagem de São
Domingos de Cocullo, na igrejinha fundada por missionários italianos no Arraial
de Mato de Dentro.
- Boa
comadre! Mas bem sabes que não é assim, mas tua história nos diverte e ao bom
Deus, que nos deu de divertir, não aborrece. Viva
São Domingos de Cocullo!!!
Tio
dedilhou a viola, seu compadre bufou a sanfona, tia zuniu o triângulo. Pe
Alípio conduziu Maria Rita num xaxado, fechando os festejos de São Domingos de
Cocullo.
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