“... todos iam trocar beijos, brindar e desejar
feliz ano novo uns para os outros...”
Por recomendações médicas,
evito os telejornais. Por posições ideológicas não leio Folha, Estadão, Globo, Veja,
Isto é... Por motivos de saúde e por motivos ideológicos sou um alienado. Isso
não me impede de tomar ciência dos fatos mais gritantes. Depois tem pessoas que
esperam e instigam-me a comentar um ou outro fato. Hoje fui apresentado ao
texto do Contardo Calligaris, de sua coluna semanal no cotidiano Folha de São
Paulo. Ele comenta o atentado de Istambul, que matou 39 pessoas e o massacre de
Campinas, em que uma família foi dizimada por um misógino substanciado por
ideologias de ódio que nos campeia.
“Quando
alguém ataca uma festa, é quase sempre porque ele não foi ou não se sentiu
convidado”, comenta Contardo. Pode ser.
Mas a festa pode ser apenas a oportunidade para cometer a sandice que orienta
minhas ações. Será onde eu vou encontrar, com segurança, as pessoas que
pretendo atingir, e para o meu ato não há necessidade de convite.
“As festas, em tese, deveriam espantar a
tristeza, mas conseguem apenas escondê-la”, discorre Contardo. Caso me engane,
Aristóteles já dizia, com outras palavras, que por confundirmos os meios com o
fim, nos perdemos naqueles e nos afastamos do último. Isto se dá porque sabemos
o que queremos, mas não lhe conhecemos a face. Numa festa queremos
confraternizar e divertir-nos, mas nos falta, às vezes, a noção de confraria
e divertimento. Festa é um meio com um
fim que não é espantar tristeza, se a estamos usando para isso, o fim é mesmo a
frustração. Mas frustrações não nos leva a matar ninguém.
No máximo procuramos um analista, que é uma forma de nos matar.
“A ideia da
festa da qual fomos excluídos está na mente humana há muito tempo.” Continua
Contardo, fazendo referência a Avner Falk “(um grande psicólogo israelense)”
que relaciona a queda do paraíso ao trauma de nascer e crescer.
Seja o ato
de Istambul, seja o massacre de Campinas, não os consigo ligá-los a traumas ou
mitos remotíssimos. Eles têm a ver com ideologias modernas, que pensávamos
superadas, mas que bafejam-nos seus horrores. Lembro que recentemente um
deputado, em tribuna, em rede nacional, tripudiou uma mulher, oferecendo seu
voto contra ela, ao homem que a torturou no período mais nefasto de nossa
história. Misoginia e ódio tratado como ação política e festejado por milhares
de Sidneis, Brasil a fora. O crime de Campinas se liga mais ao clima de
acirramento das lutas políticas ideológicas e fisiológicas que à nossa sede de
paraíso.
Há pessoas para
quem qualquer festa “parece extraordinária”, principalmente quando elas se
“sentem excluídas”. Mas geralmente essas pessoas apenas resmungam sua solidão.
Mas há pessoas que não gostam da festa alheia, não por ter sido excluído, mas
porque se colocou numa posição de não aceitação do gozo do outro, ou por querer
determinar o gozo do outro, subvertendo a alegria alheia em dor e sofrimento. Istambul
está nesse percurso.
Sidnei
é uma outra história. A intolerância como ação política inflou a
misoginia de Sidnei e a mistura do subjetivo ao ideológico e suas cargas
emotivas o levaram ao crime horrendo que cometeu. Outros Sidneis hão de se
levantar. Sidnei era misógino, ainda temos que considerar os homofóbicos, os racistas,
os religiosos fundamentalistas, os xenófobos.
O furo
continua. Mal arranhamos a borda!
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