O
abstrato não é algo que brota na mente, é algo que se abstrai de algo concreto.
Do nada não se abstrai nada. De abstrações também se abstrai; a abstração
primeira é sempre de algo concreto. O impossível do absoluto é ele ser
abstração de abstração à enésima potência.
Eu
vejo um pássaro voando, pássaro é abstração de algo que voa. Voar é abstração
de uma forma especifica de deslocamento.
Desse algo voando eu digo ser pássaro e não avião, abstração de um outro
algo, que também se desloca no ar. Do pássaro, e não de aviões, de seu voo eu
abstraio liberdade. Da criança na areia,
construindo castelos, banhando os pés na água, abstraio contentamento e torno-o
desejo. Desejamos abstrações. O desejo
anda lá nas esferas do absoluto, embora também nasça do concreto.
É um
fim de tarde. Os pescadores arrematam os últimos preparativos antes de
lançarem-se ao mar. Lá no horizonte o sol vai empalidecendo-se, dando lugar aos
primeiros vestígios de uma noite que promete estrelada. Acompanho os últimos
turistas recolhendo suas tralhas, pondo-se a caminho das pousadas: “amanhã tem
mais!”, grita um ao filho que teima em continuar um com o mar.
Tomo
um gole da cerveja e corro a costas da mão pelos lábios. Sorris-me. Teu sorriso
é vida à enésima potência, abstraio. O desejo é que o tempo pare.
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