quinta-feira, agosto 12, 2021

MARIA RITA

 Certo sábado, tardezinha

Gazeando pelo bosque

Findei no riachinho

Dando-me com Maria Rita

Tolhendo-se o vestido de chita

 

Entre as folhagens das árvores

Aves gorjeavam festivas

Ansiosas, as águas do riacho

Murmuravam de expectativa

 

Sem alarde e gatuno

Camuflei-me entre arbustos e folhagens

Para contemplar oportuna miragem

 

Seu corpo jambeado

Aos poucos se despindo

O colo, os pequenos seios

Os francos, as pernas

Em tudo bem talhada

Ao sol se mostrava

 

Concentrava os olhos à sua calcinha escarlate

Escorregando por suas pernas

Mas o que eles intentavam,

De entre os negros pentelhos,

A fenda, a flor de Vênus,

Por distante que estavam

Não contemplavam.

 

Maria Rita, então,

Prendendo os negros cabelos

Lá onde as mulheres batem pano

Estirou-se por bom tempo

O sol, o vento

Tudo era contentamento

 

Mas o espanto do assistido estava por vir

A festa em meus olhos era imensa

Meu corpo, extasiado, bulia

O barrote hirto a mão pedia

 

Inocente de meu indecoro

Atendendo aos apelos do riacho

Em suas águas, Maria Rita mergulhou

E, nas águas extasiadas,

Em majestosa cobra se transformou.

 

 

 

 

 

segunda-feira, agosto 09, 2021

SER GRANDES É ESCOLHA

 


Destas Olimpíadas saímos com uma certeza: Não somos pequenos, somos, por escolhas políticas, escolhas que nos fazemos, apequenados. As olimpíadas ensinam-nos que com investimento, podemos competir de igual com atletas do mundo todo, em qualquer modalidade. Ao lado do esporte, a educação, a arte, a promoção social, são os caminhos de uma nação soberana de verdade. Nosso apequenamento cotidiano é descaso e conluio. Descaso para com a coisa pública; conluio de políticos interesseiros e setores elitistas e reacionários, que submetem os serviços, e equipamentos, o funcionalismo públicos ao sucateamento, ao loteamento, ao desrespeito e à ineficiência (sim, a ineficiência do funcionalismo público é estratégia política). Os interesses particulares não tornam o Estado enxuto, mínimo, o apequenam. Nosso elitismo vagabundo nos apequena. Mesmo assim, demonstramos que possuímos uma grandeza tal, que há de brilhar. Mas ser grandes não é uma sina, não está escrito no livro universal. Ser grande é uma escolha e requer insistência, resistência, luta. Se sem recursos, sem investimento, pudemos sair grandes das olimpíadas (isto não se aplica à seleção masculina de futebol, que mesmo ganhando, ao receber a premiação, mostrou-se pequena), com estudo, com formação, com condições adequadas de desenvolvimento físico, mental, intelectual, poderíamos ser maiores ainda: uma potência. A cada atleta, de cada modalidade esportiva, agradeço o empenho, a dedicação, a grandeza com que nos representou. Estarem nas olimpíadas, nas condições em que se encontram os nossos equipamentos e investimentos em esporte já foi uma grande conquista. Novamente Obrigado! Agora cabe a nós decidirmos se queremos trilhar rumos de grandeza ou manter-nos apequenados, vendo o país ser desmontado para submeter-se a interesses puramente econômicos de uma classe ignorante, mesquinha, submissa ao mercado, sob a regência de um governo nefasto. A lição foi-nos dada. Devemos esperar às próximas olimpíadas, para nos relembrar o quanto podemos ser grandes?  

quinta-feira, agosto 05, 2021

SOBRE PALAVRAS E AMOR

O texto que segue eu o colhi dos cadernos de ensaio de Euripedes Santos. E embora esteja intitulado "Rascunhos para um Romance", ele pertence ao conjunto de cartas que Euripedes escreveu para “Flor de minha existência”, cujo verdadeiro nome Euripedes sempre manteve oculto. Se seguirmos observações de Rodner Lucio, “Flor de minha existência” é, com razoável probabilidade, Ihvs Aghapemene, que Euripedes Santos cultivava em seu jardim.



Falar é um mal necessário! Quem muito fala tem pouco a dizer e provoca mais desentendimento que esclarecimento. Por outro lado, as coisas precisam ser ditas, mesmo que escapem à fala e aos termos que as qualificam. Escrever é menos necessário que a fala. Quem fala pretende ser ouvido. Há quem escreva para não ser lido. Há, na escrita a pretensão de ordem e clareza. Mas tal pretensão não suporta uma leitura mais atenta. Toda escrita suscita questionamento, novos argumentos. Ciente de tais limitações, eu me sinto mais seguro escrevendo. Não é uma justificativa; é algo próximo de uma psicanálise, busco um autoentendimento: “falando nos curamos”, disse-me um amigo.

Na infância, por vergonha, engolia as palavras. Fui, muitas vezes, chacoteado por trocar o “l” pelo “r”. Acabrunhado, isolava-me, escondia-me nos livros de meu avô. E, por defesa, compus-me este personagem circunspecto e sisudo.

Para evitar, ainda hoje, incômodos, evito falar, engulo as palavras. Mesmo junto de ti passos horas em silêncio, engolindo as palavras. Não é por vergonha; é por receio. E meu receio é perder-te.

Quando em sua presença, penso abrir-te um largo e generoso sorriso e dizer-te com viva animação de meus dias e de como anelo-te percorrendo a vida comigo. Mas basta que me ergas o olhar para eu emudecer e carrusmar-me. Voltemos à palavra.

A palavra escrita é limitada, ordena o pensamento, mas não desce às emoções, às sensações, aos sentimentos mais profundos. Não há palavra que descreva, uma dor, uma alegria, as confusões mentais provocadas por “bobagens” ou por "questões graves".

A realidade toda não cabe na fala; não emerge na escrita. Na fala, na escrita, a realidade dissimula, sorri-nos e escapa-nos. Não é dito: "na escrita, o poeta finge a dor que não sente”?. Por vezes, ele não atinge dizer toda a dor que sente. Depois a realidade não é um estado imóvel, completo, definitivo. E aquele que a retrata está nela precariamente, susceptível a inúmeras circunstâncias. Escrever é ter ciência das incompatibilidades entre sentir e pensar e representar um e outro.

O comportamento indica apenas a desordem, nunca as motivações. Se de fato “o poeta finge a dor que sente” e o filosofo “especula acerca do que é ausente” como indicar se a dor é dor ou fingimento? E se é dor, como classifica-la “bobagem” ou dor grave?

Dizia minha avó: “este menino”, e apontava o dedo para mim, “em um copo d’água, faz tempestade”. Minha avó aconselhava-me: “Antes de quebrar, encha os pulmões de ar e grite tua raiva.” Até hoje, geralmente, engulo o grito e explodo em arremesso de objetos.

O medo é uma força estranha. Acua-nos, imobiliza-nos, emudece-nos. O medo também provoca desatinos e produz atitudes desesperadas. Insegurança produz medo. E num relacionamento, o acumulo de medo é o ciúme. Ciúme é incerteza quanto ao amor que se deseja receber e excesso de confiança quanto ao amor que se dá. E eu sei de teu amor, receio não amar-te à tal altura. Pouca estima também produz medo.

Somos racionais? Sim! Mas somos sobremaneira passionais. A razão nos guia, mas o que nos move ou imobiliza são as paixões. E estas duas faculdades nunca estão de acordo. Em mim são totalmente assimétricas.

“Passo os dias à beira do abismo” pode ser apenas figura de linguagem; uma construção fictícia. Mas descreve também a condição espiritual de uma pessoa.

O abismo abriu-se diante de mim na noite em que dissestes: “quero experimentar um outro amor”.

E eu vivo com esta sombra: de um outro amor surgir-te.

Não te quero presa a mim. Mas te anelo de tal forma que perder-te é não ser.

Li em algum lugar um dito de Ovídio: “Vejo o que é melhor e aprovo; sigo o que é pior”. Paulo diz a mesma coisa em uma de suas cartas. Amo-te deste amor que, assim, no papel, compreende querer-te o que é melhor e o melhor é que sejas livre e ame quem queiras. Mas, por medo, assumo atitudes que te reprimem e me fazem perder-te.

Amar, bem sei, não é sentir: Amar é querer.

Com todas as contradições que carrego, eu só posso querer por mim e em mim. E eu quero que as coisas aconteçam como têm que acontecer. Assim, amar-te-ei amando tua vontade, mesmo que tal vontade seja, de mim, querer afastar-te.

Receio perder-te, e tal receio me dilacera. Ando sem chão, o abismo se me abre, apela-me ao salto. Imponho-me, sem razoabilidade alguma, superar as conturbações que me assolam.

Eu quero amar-te assim: amando tua vontade, mesmo que seja não me amar!

Querer é uma palavra desarrazoada, sem profundidade.

Desarrazoado temo perder-te!

 

terça-feira, agosto 03, 2021

QUEBRANDO TABU

Ser religioso significa ser do Bem sim. O Sumo Bem é o sentido religioso por excelência. Está certo: apedrejar e queimar mulheres não é religioso, exterminar povos não é religioso, explorar e escravizar pessoas não é religioso. Jesus era religioso. E ao defender a adultera foi isto que Jesus declarou. Declarou o mesmo à samaritana, diante do poço de Jacó. Ainda ilustrou em parábolas, como a do bom samaritano. Ser religioso é acolher, curar, consolar, cuidar, respeitar, proteger, restaurar, perdoar, (Mateus 25: 35-40). Nenhuma destas ações é restrita ao religioso, é requerida a qualquer pessoa. À pessoa que se diz religiosa, mesmo não sendo cristã, que é outra história, se impõem imperativamente. O Bem, antes de ser um conceito moral, é a face de Deus nos esfomeados, nos sedentos, nos adoentados, nos perseguidos, nos expropriados (Mateus 25:35-40). Jesus não fundou religião, mas ensinou a ser religioso, ensinando que fazer o bem não é fazer propaganda de si. O bem não se exibe.