quinta-feira, agosto 30, 2018

ARENGA SETEMBRINA



Todos os dias quando acordo
Lamento o dia que vou ter,
No peso de o viver
Tenho um dia todo pela frente
E o vivo
Minuto a minuto
Desejando não ser
Todos os dias ante de dormir
Eu revejo como foi o dia
E lamento o acidente que não veio
A bala perdida que não me encontrou
A coragem que me faltou
Tomo remédio para esquecê-lo
Todos os dias,
Por um fio,
Não desisto de mim.


sábado, agosto 25, 2018

MÁSCARA

(1ª Oficina de máscara da Associação Cultural Fazer Acontecer)

A máscara precisa de corpos e olhares que transmitem energia, caso contrário, parecerá pendurada em um manequim. (Duccio Barlucchi)

    O que segue é uma adaptação livre de entrevista de Duccio Barlucchi, ator, autor e diretor de teatro, escultor de máscaras, estudioso e pesquisador sobre o tema da criação e uso da máscara teatral contemporânea, em Le Maschere Teatrali come strumento formativo efficace (1) .

    A máscara acompanha a jornada humana desde os primórdios do tempo; foi uma das primeiras formas de o ser humano relacionar-se com o sagrado do mundo,  isto é, com as forças naturais e espirituais percebidas, mas não representáveis ou formalmente identificáveis, e estabelecer comunicação direta com elas.

    Enquanto a pintura e a escultura sempre foram usadas para representar o irrepresentável e os símbolos de culto, através da máscara o ser humano criou um instrumento particular, cuja característica fundamental é ter olhos vazios, para receber o olhar humano, e atuar na fusão entre as duas energias, a do poder representado nos mistérios que envolvem a Terra, o plantio e a colheita, a fúria dos ventos e da chuva, a saúde, a doença, as fases da vida, e do poder humano, empossado no usuário, seja ele xamã ou ator.

    Em síntese, a máscara tem uma função "desumanizante", e deve fornecer ao usuário uma face "nova”.  Quando um endossa uma máscara deixa de ser ele próprio para ser o que a máscara lhe impõe. Uma vez endossada, é a máscara que lidera o jogo e leva o ator a descobrir gradualmente atitudes físicas, expressivas e vocais mais adequadas; é ela quem guia e traz uma presença de gestos, movimentos, vozes, ao seu portador, que revelam muitos aspectos não da pessoa, mas da máscara. Ao mesmo tempo, a mesma máscara usada por pessoas diferentes dará origem a diferentes transformações, permitindo
também trabalhar as características pessoais.

    Cobrindo o rosto de quem a usa, a máscara revela capacidades que o indivíduo sem uma máscara provavelmente não sabe possuir ou não se permite. Ela obriga o individuo a sair de sua cotidianidade, a não permanecer "normal". A máscara é como um casulo que desperta da lagarta a borboleta, a mais expressiva liberdade.

    Neste sentido, seja no palco, que em rituais religiosos ou no carnaval, a máscara representa o elemento "transgressivo", que coloca aquele que a usa além das convenções normais e diárias, e permite uma vasta gama de possibilidades, isto é, permite que se trabalhe com grande eficácia características físicas, emocionais, psicológicas e relacionais, ajudando a descobrir e refinar vários modos de expressão e comportamento, e diferentes estilos de comunicação. 

    A máscara para cumprir sua função, precisa contar com a postura e presença física de quem a usa. Sua expressão, sem o olhar humano que a anime, e sem um corpo presente para dar a fisicalidade adequada, permanece vazia, e a máscara um mero objeto.

    Feita para despertar o sentido de ser, para revelar o sagrado na natureza e no humano, a máscara deve ser bem feita, a fim de ser feita para viver.  Para DUCCIO BARLUCCHI, a máscara “deve ser uma boa escultura, capaz de vitalidade cênica, de comunicação emocional, de integração com o corpo e a aparência do usuário trazendo para fora o outro de si mesmo”.


1- https://www.teatroimpresa.it/admin/dati/336_Intervista%20Duccio%20Barlucchi%20-%20Maschere.pdf

NOSSAS FRUTAS


A jornada não é das melhores! Passei a noite praticamente em claro, virando de um lado para outro, levantando e andando pela casa, ligando e desligando a televisão. Agora me vejo diante de um acumulo de relatórios para dar cabo, um idiota tagarela que emenda um assunto em outro sem respirar, conciliando o resultado de uma partida de futebol lá na França, as pregações de um certo pastor midiático, as disputas eleitorais,  a suposta vida boa no Japão, que ele pensa ser na Europa, em uma só ideia: “o brasileiro não presta”. Os idiotas tem essa característica falam pelos cotovelos, uma rajada de sandices e querem estar certos. Tento não dar-lhe atenção e concentrar-me nos relatórios.
Meu corpo opera uma centena de funções que independem de minha vontade. O sangue que corre por minhas veias, o coração que pulsa, a produção de glóbulos brancos, a respiração, o fio de cabelo que se solta de minha cabeça, nada disso é uma determinação minha, independe de minha intenção ou intervenção, acontecem, simplesmente acontecem.
Há também os automatismos psíquicos. Ideias, vontades, desejos, memórias, fantasias, pensamentos de toda ordem, conexos e desconexos com a realidade, irrompem em mim sem que eu os queira no instante em que irrompem. Essa fuga, por exemplo, deste trabalho técnico, burocrático, maçante, que exige clareza e precisão, em reminiscências de nosso primeiro encontro, um distante domingo de primavera, durante um passeio ao Ibirapuera. Foi o Bacana quem me apresentou a ti: “Ele tem este jeito de quem está “bolado”, mas é só tipo, é um cara legal”. Você riu. Seu riso me salva da papelada.
Assim, enquanto eu registro que a Casa está com 50 adolescentes e relaciono o número de refeições e cada item de cada refeição numa planilha, ao relacionar que no dia tal, no almoço, foi servido fruta, vem-me à mente as frutas de nosso pomar. Elas estão amadurecendo.
As fotografei em um banho de mar, elas atraem o olhar, despertam o apetite, já se sente o paladar de suas carnes. Ainda correm ingênuas ou despreocupadas, saltam graciosas as ondas do mar e constroem castelos de areia. Logo, logo estarão maduras. O que era em seus corpos brotos despontando, já são peras bem formadas...
O falastrão não termina nunca de falar e vaticina: “Nós cidadãos de bem, temos direito de nos defender!”
Somos um jogo dos automatismos biológicos e psíquicos que tentamos manter sobre controle com dietas, exercícios, disciplinas. Desenvolvemos regras, leis, normas para o corpo e a mente, mas o coração funciona por funcionar, como o desejo de um café apenas coado com bolinhos de chuva como vó fazia, aflora e basta. Poderia controlar a vontade de pedir ao sujeito de calar a boca, poderia não dar-lhe muita atenção, concentrando-me nos relatórios, divagando sobre nossos planos de férias, poderia deixá-lo falando sozinho, ir ao banheiro, tragar um cigarro, mas: “quanta idiotice!”, escapou-me da boca. Tivesse o cidadão de bem uma arma, todo o automatismo que me rege cessaria. Restaram as ofensas e ameaças. Não posso evitar que me venha ideias absurdas a seu respeito. Agora preciso de um conhaque, não de um café.
Nós podemos sustentar muitas coisas: valores, opiniões, fé, ilusões, descrenças. Eu sei que não podemos impor, apenas expor, ao outros o que achamos certo ou errado, e que devemos nos submeter às criticas e rejeições a nossos posicionamentos. Algo, no entanto, precisa ser acordado: cordialidade, bom senso, respeito, democraticidade são desejos comum. “Todo bom diálogo parte do que é comum para voltar ao que é comum, estabelecendo as divergências.”
Volto a pensar nas frutas de nosso pomar, conjecturando um provérbio de minha avó. Dizia ela: “fio há frutas que ao apetite é doce, ao paladar amargo. Quando não mata o corpo, fere a alma.” E completava: “Fio, um corpo sem vida é mais razoável, que um corpo de alma ferida”.
Somo seres pluricelulares, pluripsíquicos, plurirelacionais: milhões de pensamentos, desejos, gestos e vontades misturam-se a milhares de atividades de nosso corpo sem nos darmos conta. Somos pluripotentes, o que estamos sendo neste instante é só uma possibilidade, numa determinada circunstância. Mas o que somos a cada instante na circunstância em que estamos está conectado a uma escolha, uma aposta anterior que eliminou todas as outras possibilidades. Só podemos intervir sobre o que poderemos vir a ser, possibilidade não é certeza é risco...
Como velha raposa, volto aos relatórios: 18h/aulas de Capoeira no campo A, 18h/aulas de Fotografia no campo B..., “nossas frutas ainda estão verdes”.


sábado, agosto 18, 2018


PARQUE DE DIVERSÃO

A vida é uma montanha russa em movimento,
Às vezes emociona, às vezes é um tormento,
Mas de vez em quando paço um pouco de tempo,
Vou para o carrossel e aproveito o momento,
No carrinho bate-bate, a coisa é mais agitada,
Com minhas alegrias naquela pequena estrada
Na roda gigante, minha parte apaixonada,,
No topo vejo a vista ao lado de minha amada,
E no fim do dia, fecho o parque, vou descansar,
No dia seguinte volto a trabalhar.


domingo, agosto 12, 2018

PROPOSIÇÕES POLÍTICAS




Em qualquer disputa eleitoral, seja para o grêmio da escola, seja para sindico do condomínio, seja para representante da turma na comissão de formatura, o sujeito não é candidato de si mesmo. Ele representa determinados interesses de um determinado coletivo. A representação política é representação de um coletivo e de suas concepções de governo. Um candidato não fala de si, nem por si, ele fala em nome de um grupo que o indica e que sustenta sua campanha. Ele não precisa entender de coisa alguma: economia, saúde, educação, segurança etc., ele precisa encarnar concepções de como governar e para quem governar, concepções respaldadas por quem o indica e sustenta sua campanha. Então me interessa pouco o que o sujeito, enquanto indivíduo, pensa sobre economia, saúde, educação. Interessa-me, mais, saber quem apoia e sustenta sua campanha. Por exemplo, o sujeito fala: “vamos investir em saúde”, interessa-me saber se ao lado dele está representantes da saúde popular, ou a Amil.  Se um candidato declara: “Vamos priorizar a Educação”, interessa-me saber o que os educadores pensam dele, o que as empresas de educação pensam dele. Se o candidato diz: “Vou rever a taxa de juros”, eu quero saber se há bancos investindo em sua campanha. Então, não me importa se, num debate, o candidato fala uma idiotice qualquer, me interessa saber quem o indicou e quem sustenta sua presença ali, no espaço de debate e respalda sua fala idiota. Eu não voto num sujeito, eu voto numa concepção de mundo, de ser humano, de governo, de política. E digo logo que estou mais à esquerda...