quinta-feira, setembro 22, 2022

SALTA DO MUNDO

 


Deus me proteja de mim e da maldade de gente boa. (Chico Cesar)

 

Hoje estou em estado de choro. O vento me move lágrimas, o sol me move lágrimas, o casal de pássaros, do mamão fazendo refeição, me movem lágrimas. Não são tais encantos os motivos do pranto que seguro. O pranto que seguro é de ontem, do ler que uma criança violentada foi culpabilizada pela violência sofrida. O pranto que me vem de ter é da indignação apenas, é, sobretudo, de uma impotência, de minha inútil presença no mundo ante pessoas que pensam ser inteligente “achar graça de tudo” e não se perceberem se desumanizando. Meu corpo esta noite se recusou a dormir, perambulou tal zumbi pela casa, abriu e fechou portas e janelas, acendeu e apagou as luzes, procurando formular respostas ao babaca que “de tudo acha graça”. Que graça há em uma criança violentada? Não há repostas. Há coisas que não precisam de explicação, e dadas a idiotas nada lhes esclarece, apenas produz mais confusão. Este silenciar aos estúpidos me fere. A rigor, é ultrajante ter que explicar o explicito. Só me vem de chorar minha impotência. E meu choro está seguro por sertralina. Do sol em minha pele me vem de chorar seu inútil calor em meu ser, incapaz ante os que condenam crianças por seu sofrer.  O absurdo desumano, tornado graça para um idiota letrado, me convida ao choro.  Nos ouvidos, um sussurro: “salta, salta do mundo!” Tomo outro comprimido, o choro reprimo. Chico Cesar me salva dos sussurros!

sábado, setembro 17, 2022

BEIJO QUE ANELO

 


 

Saudações, aquela que anelo!

Ultimamente tenho pensado insistentemente em ti. Agora mesmo, falava de ti com a faca.

Insinuante a faca sorria-me, exibindo sua lâmina afiada. O menino,  acordou, em prantos, assustado. Teve um pesadelo.

Cara amada, por que brincas comigo deste modo? Por que não me beijas logo, num acidente de trabalho? Quem sabe um infarto? Poupa-me deste ato.

Insone, ando pela casa, ouço meus comprimidos, sugerem-se todos em um só gole de vodka. Estou preste a dar-lhes ouvido.

Deito-me ao lado da flor que me prende. Brinco com seus cabelos. Beijo-lhe os olhos dormente. Penso escrever-lhe um último texto.

Invade-me de alento, seu despertar sorrindo-me. Seus lábios no meus, expulsa-me os fantasmas. Por hoje eu vivo.

Outra hora, aquela que anelo e de mim escapa, havemos de nos abraçar. De quem será a iniciativa, minha ou tua, do beijo que anelo?