Os
fatos que ora narro ocorreram de recente numa cidade provinciana, nos limites
da Capital.
Famílias
de influentes religiosos e influentes políticos fizeram aliança para assumirem
a gestão da singela cidade de Nova Jerusalém. Para selar o pacto acertaram, sem
consultar os interessados, o casamento de Elis A Beth e um tal Cardoso. Ocorre
que, numa certa, tarde Elis A Beth, encontrando-se só – os pais viajavam – recebeu a visita de um parente
sacerdote que pretestou portar noticias de uma tia distante. Elis A Beth o
acolheu, “era parente, era sacerdote, trazia noticias de uma tia distante...,
era gentileza oferecer-lhe ao menos um copo d’água...
Era
tese central do pacto político entre os influentes religiosos e os influentes
políticos a defesa da “família tradicional” e seus valores. E caberia ao tal
Cardoso, distinto intelectual, elaborar as bases programática da futura
campanha eleitoral, ressaltando os tais valores que garantiriam a sacralidade
da família tradicional, os direitos dos cidadãos de bem, a responsabilidade da
mulher-mãe, sob qualquer circunstância, em garantir os desígnios divinos.
Elis
A Beth ficou meses em viagem. Diziam ter ido assistir a prima distante. Quando
retornou sucumbiu aos interesses de seu clã, casou-se com o tal Cardoso, que
ciente do seu infortúnio, mas visando manter o pacto pela gestão da cidadela, acolheu-a
distintamente.
Elisa
a Beth, por completar 17 anos, apareceu na noite de Natal, num especial
televisivo, discursando a respeito do dom da vida e da responsabilidade da
mulher-mãe, sob qualquer circunstância, em garantir os desígnios divinos.
Tomava por modelo a judia Maria.
Nos
olhos de Elis A Beth se antevia, no entanto, que ela desejava outra narrativa,
a sua narrativa. A narrativa de uma certa tarde sombria, em que um parente
sacerdote, aproveitando a ausência dos seus pais... Aquela tarde povoa suas
noites de sono, a sufoca de dor e o sofrimento, mas daquela tarde ela nunca
pode falar. E, em frete as telas, é preciso sorrir e manter o pacto.
Elis
A Beth, nos bastidores, chorou o filho que não nasceu, o menino Jesus abortado,
exigência do tal Cardoso e assentido pelos influentes religiosos, para garantir
a aliança pela governança da provinciana cidadela aos limites da Capital.
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