“O
ladrão vem apenas para roubar, matar e destruir; eu vim para que tenham vida e
a tenham em abundância.” (Jo 10,10)
Teologicamente vida em abundância significa
vida para além da vida cotidiana, da vida terrena, isto é, significa vida
eterna como explicita documento da Igreja Católica: “O homem é chamado a uma
plenitude de vida que se estende muito para além das dimensões da sua
existência terrena, porque consiste na participação da própria vida de Deus.
[Evangelium Vitae].
Assim, “ao apresentar o núcleo central da sua
missão redentora, Jesus diz: “Eu vim para que tenham vida, e a tenham em
abundância” (Jo 10, 10). Ele fala daquela vida “nova” e “eterna” que consiste
na comunhão com o Pai, à qual todo o homem é gratuitamente chamado no Filho,
por obra do Espírito Santificador. Mas é precisamente em tal “vida” que todos
os aspectos e momentos da vida do homem adquirem pleno significado.” (Idem)
No entanto, associado ao âmbito econômico,
uma certa teologia, uma certa visão deturpada, tende a entender abundância como
riqueza, prestígio, privilégios, posição de poder. Desta visão, muitos
representantes religiosos aproveitam-se para vender um mundo de ganhos
materiais exorbitantes e uma vida de honrarias, prestígio social, posições
políticas de comando etc., a seus fiéis. E se muitos perseguem está abundância,
a do acúmulo de bens matérias, do luxo e da ostentação de uma graça que não
corresponde às promessas evangélicas , é porque seus guias religiosos são, na
verdade aqueles lobos em pele de cordeiro, que o Cristo anteviu: “Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas,
que vêm até vós vestidos como ovelhas, mas, interiormente, são lobos
devoradores.” (Mt, 7, 15).
Neste mundo, o Cristo não promete vida fácil
aos que o seguirem pois: “Se me perseguiram também vos perseguirão” e “o mundo
vos tratará mal por causa do meu Nome, pois eles não conhecem Aquele que me
enviou” (Jo 15, 20;21). E depois, ele anuncia que seu reino é dos pobres, dos
humilhados, dos explorados: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e
oprimidos, e eu vos aliviarei”.
Por isso, os evangelhos te impõem um
compromisso: acolher os que sofrem e ou são perseguidos, reconhecendo neles o
Cristo: “porque tive fome, e me destes de comer; tive sede, e me destes de
beber; era forasteiro, e me acolhestes; estava nu, e me vestistes; adoeci, e me
visitastes; estava na prisão e fostes ver-me” (Mt 25,35-36). São a estes, em
especial, que o Cristo oferece sua morte sacrifical.
Na ordem dos direitos, podemos alinhar “vida
em abundância” ao desenvolvimento pleno,
à integridade, à dignidade de cada pessoa humana.
Nestes tempos de política de exceção, em que
o atual governante, como ladrão, entra pela janela da história, assume de forma
vergonhosa o governo e arranja em torno de si uma equipe de governo interessada
em salvaguardar seus próprios interesses e de grupos políticos e econômicos com
os quais são comprometidos. Para estes usurpadores de nossos votos e destino
político, o pleno desenvolvimento, a dignidade e
integridade dos menos favorecidos e da classe trabalhadora se acham ameaçados.
Os esquemas de corrupção e alienação política escancaram os interesses das
elites abastadas e dos iludidos de a elas ascenderem, que, em nome de um falso
moralismo, fecham os olhos aos que se apropriam do poder em beneficio próprios
ou de seus aliados e perseguem os que continuam a árdua tarefa de defender
direitos sociais e trabalhistas arduamente conquistados.
Nesta perspectiva, milhões de pessoas são
colocadas à margem todos os dias, impossibilitadas de atenderem ao que se
considera mínimo para sua inclusão entre os seres humanos, sem acesso algum aos
benefícios das novas tecnologias e dos avanços econômicos e científicos, que
deveriam ser de alcance universal.
Crer em uma vida abundante é defender e
promover os menos favorecidos, os injustiçados, o estrangeiro expulso de seu
território de origem e lembrar que o Direito á vida plena não é privilégio dos
abastados, mas dever do Estado para com todos os que estão à margem,
explorados, humilhados, destituídos de seus plenos direito de cidadania e de
pessoa humana.
Não creio no Deus de Francisco, mas, como
ele, acredito que “o sentido pleno da
vida individual e coletiva se encontra no serviço desinteressado em favor do
outro e no uso prudente e respeitoso pela criação, pelo bem comum” e que a
“medida e o indicador mais simples e adequado de realização da nova Agenda para
o desenvolvimento será o acesso efetivo, prático e imediato, para todos, aos bens
materiais e espirituais indispensáveis: habitação própria, trabalho digno e
devidamente remunerado, alimentação adequada e água potável; liberdade
religiosa e, mais em geral, liberdade de espírito e educação” (Papa Francisco
em discurso na ONU, em 25 de setembro de 2015).