quinta-feira, junho 28, 2018

ENQUANTO A BOLA NÃO ROLA

          Está rolando um bolão aqui na repartição, e, enquanto nos preparamos para acompanhar a partida, o assunto é a troca-transferência de funcionários de um setor para outro. E para explicar a eficácia de tal procedimento, um graduado narrou a história que segue.
          “Em uma época remota, em um lugar insólito, um certo tipo tinha dois carros em sua garagem com um mesmo e peculiar desajuste mecânico: baterias arriadas. Certo dia o sujeito acordou disposto a ajustar os carros e, por garantia, consultou um mecânico. O mecânico orientou-o a recarregar as baterias e, em último caso, trocá-las. “Era obvio”, pensou o tipo, que optou pela troca das baterias. Mas qual? Feita a operação, nada de os carros funcionarem. O tipo praguejou os mais obscenos impropérios contra o mecânico. Bufando contra sua ineficiência, acionou-o indignado. Após rápida inspeção nos veículos, o mecânico observou: “meu senhor quando eu vos orientei a trocar as baterias, eu entendia dizer por baterias novas e não de um carro para outro.”
            Vamos ao jogo...

terça-feira, junho 12, 2018

Anthuérpia de Assunção Ramires



Anthuérpia de Assunção Ramires, a terceira e a mais longeva das doze filhas de coronel Ramires, passou em seus aposentos a maior parte de sua fugaz existência. Tia a assistiu em seus últimos anos e, com vó, fazia-lhe unguentos, banhos e rezas para lhe tirar quebranto. Certa vez as acompanhei. Castigo por espiar as formas de prima por entre frestas e buracos de fechadura...
A menina era magríssima, olhos desalentados, esbugalhados, a pele pálida de veias esverdeazuladas, cabelos corrediços esbranquecidos, a voz lhe sumia entre tosses e o sangue que cuspia numa vasilha de prata. Deixei-a aturdido, com uma forma de angústia que me rodeia até hoje. Seu passar foi um acontecimento no arraial. Coronel mandou trazer ataúde da cidade todo forrado em cetim, encomendou vestido de noiva a Dona Zé, e exigiu os ofícios presididos pelo bispo em pessoa.
Preparava-me para as confissões. Apareceu-me com sua figura pálida no vestido de noiva. Creio que cheguei ao tom de sua palidez. Por um instante o coração pareceu-me não responder, suei e molhei-me todo. Ela sorriu-me um sorriso sem brilho, os olhos esbugalhados envolviam-me. Sussurrou em meus ouvidos sua voz fugidia: “não há lugar para mim em parte alguma, nem na morte”...
Deixei a igreja vertiginoso. Fiquei dias abismado. Vó recorreu às suas rezas e quebrantos. Depois de um período longo de mudez, expliquei a tia o acontecido. Tia mandou rezar missa para as almas do purgatório. Nunca mais soube o que é dormir sem sobressaltos.
De recente, voltando da caminhada matinal, resolvi sentar próximo ao lago, debaixo de uma mangueira, e acompanhar o nado descompromissado de um grupo de patos: “Enterraram-me viva”, senti aquela voz característica sussurrando em meus ouvidos. Fiquei atônito, subiu-me um calafrio, desfaleci. Acordei no pronto socorro.
Enquanto espero ser liberado, folheio o Correio de São João de Curvelo, que entre outras curiosidades informa: “durante a exumação de uma antiga filha da cidade, pertencente à família dos Ramires, notou-se que a posição do corpo não correspondia à posição original, como se o mesmo tivesse se movido”. Telefono imediatamente para tia: “A bença tia! Como é mesmo aquela oração pras almas do purgatório?”

domingo, junho 10, 2018

SEM TI, NÃO SEI SER




Carta à amada que foi à padaria comprar pão e leite.

Flor de minha existência,

Estou aqui navegando de um site a outro, correndo intermináveis vezes minha timeline, coferindo emails e zaps. Procurando te encontrar, querendo te falar; sonhando o beijo que de ti eu espero para eu voltar a ser.
Eu preciso te dizer: sem tua presença aqui eu não sei ser.
A tua ausência me faz perdido; essa angustia que me assalta..., perco a paz.
Coloco no Youtube e fico a ouvir canções que narram nossa história, repito a exaustão aquela canção que lembra nosso primeiro encontro, o desajeito do primeiro beijo, as promessas de não nos deixar.
"Não adianta nem tentar me esquecer/ Durante muito tempo em sua vida/Eu vou viver..."
Nós dois, corpos colados, a dançar.
Procuro no celular tua imagem, quem sabe uma mensagem. Tem essa de nosso último passeio. Teu sorriso me aquece, por instantes me esqueço: Eu sou!
Fique sabendo que eu não sei ser sem tua presença, sem teu sorriso é tudo insípido, cinza-frio...
Se não voltas, vou sair; perder-me por aí, fugir desta tua ausência que me desestabiliza.
Não me canso de falar que te amo. Além de ti nada mais me interessa.
Esta dependência de ti é insana, eu sei! Não é amor, é loucura!
Vou te procurar. Não suporto ficar aqui a te esperar, sofro tanto não sei ser.
Quero ouvir tua voz, contemplar teu sorriso, o brilho de teu olhar. Quero jogar-me em teus braços e sentir o pulsar de teu coração, deixar-te me afagar.
Quando estou perto de ti, esqueço-me de mim. Esquecendo-me: Eu sou! E se fico um só momento distante de ti eu não sei ser. Meu mundo é insípido, um cinza-triste, sem você aqui...
Eu não sei me libertar desta loucura que é não saber viver em tua ausência. Se você demora mais um pouco, eu fico louco à beira de me perder.
Volta logo, meu amor, já não consigo mais te esperar. Não vejo a hora de te abraçar, roubar-te um beijo que ponha fim à minha exasperação.